Disciplina Leitura e Produção Textual- Profª Drª Nilsa Brito
Resenhas- Turma 2011.
As resenhas que serão publicadas no Blog da FAEL, a partir
desta semana, foram produzidas pelos alunos da turma de
Letras-Português/2011, durante a
disciplina Leitura e Produção Textual.
Adotando procedimentos de
retextualização, durante a disciplina, duplas de alunos leram diferentes obras literárias (gênero romance ou
conto) e, a seguir, dedicaram-se à
resenha da obra lida. Após a primeira escrita, os textos foram submetidos à
avaliação da turma, em sala, reescritos pelas duplas, e agora chegam aos
leitores, com informações resumidas da obra lida.
Sabemos que há ainda um longo percurso de
escrita a ser trilhado por cada autor, em busca da superação de algumas
questões de texto, mas esta é uma iniciativa que objetiva inserir os alunos em processos de escrita que
ultrapassem a sala de aula universitária! Boa leitura!
Nilsa Brito Ribeiro – Profa. responsável pela
disciplina Leitura e Produção Textual- LA/2011.
RESENHA- 01
Ana Paula Lopes de Freitas
Avelino Sousa Rodrigues
HOLANDA,
Chico Buarque de. Budapeste. São
Paulo:Companhia das Letras, 2003.
Francisco Buarque de
Holanda nasceu no Rio de Janeiro em 1944. Cantor e compositor, publicou
diversas peças e alcançou um conceituado renome na literatura nacional. No romance Budapeste, Chico Buarque narra a
história de José Costa, apresentado, inicialmente, como sócio-proprietário da
Cunha & Costa Agência. Ao longo do romance, José desloca-se entre as
cidades do Rio de Janeiro e Budapeste. A narrativa também possui um constante
jogo de duplicidades e isso vai ser característica recorrente na vida de Costa que
é narrador-personagem. Ele também se satisfaz em saber que seus textos estão
sendo lidos por outras pessoas que não o conhecem, já que opta por viver no anonimato.
Além da agência, Costa possui
no Brasil uma família: é casado com Vanda e tem um filho chamado Joaquinzinho. Em
Budapeste, conhece Kriska em uma livraria, quando tentava aprender algumas
sentenças da língua Húngara. A mulher que conhecera é uma professora que mesmo
sem conhecê-lo balançava a cabeça em atitude de reprovação daquela inútil
tentativa de Costa em querer aprender a língua daquele país. Para ele, comunicar-se na língua desconhecida
significava a certeza de sua permanência em Budapeste.
Os fatos vividos por
Costa a partir do momento em que conhece Kriska se dão por gradação, visto que
não muito tempo depois do encontro na livraria os dois passam a se encontrar na
casa dela; ele com o objetivo, inicial, de aprender a falar algumas palavras, ela,
provavelmente, tentando apagar algumas vagas lembranças do seu ex-marido, que há
pouco tempo a largara. Não demorou muito
até que os dois já estavam bastante íntimos. A língua, nessa perspectiva, foi uma
desculpa para esse casal e a ponte que possibilitou o encontro.
A afirmação de que as
aulas eram apenas desculpas para o encontro deles pode ser confirmada pelo seguinte
aspecto: Costa, apesar do interesse pelas aulas, não consegue fixar sua atenção
na explicação, vez ou outra é pego admirando aquela mulher, sem nenhum real
interesse pela aula. Além disso, o
caráter duplo da narrativa, como já mencionado, é também confirmado pelo fato
do narrador personagem possuir dois nomes: no Rio de Janeiro é chamado de José
Costa, em Budapeste, Zsoze Kosta. Tem duas línguas, duas casas, duas pátrias. O
que não muda ou diminui em José, nos dois lugares, é o interesse pela escrita.
É interessante destacar
que foi um problema com a escala de vôo quando ele voltava de um Congresso
Internacional de Escritores Anônimos ghost
writers na Turquia, fato que possibilitou todas essa narrativa de sua vida,
Foi por acidente que José Costa teve o primeiro contato com Budapeste, fato que
transformou por completo sua vida.
Durante o café, no país
ainda desconhecido, José Costa saboreia os pães avermelhados e é informado de que
os mesmos são de abóbora; após degustá-los, fica com a sensação positiva do pão
e, logo, do país. Ao sobrevoar
Budapeste, olhando da janela do avião, José fica deslumbrado com os tons que
cercam a cidade, pois em sua concepção a mesma era cinzenta e de pouca
luminosidade, porém se depara com um lugar de tom amarelado. Essa é a segunda
boa impressão da cidade.
Quando
se abriu um buraco nas nuvens, me pareceu que sobrevoávamos Budapeste, cortada
por um rio. O Danúbio, pensei, era o Danúbio, mas não era azul, era amarela, a
cidade toda era amarela, os telhados, o asfalto, os parques, engraçado isso, uma
cidade amarela, eu pensava que Budapeste fosse cinzenta, mas Budapeste era
amarela (BUARQUE, 2003, p.11.)
Após alguns meses longe
de casa, vivendo intensamente seu amor com Kriska, Costa sente vontade de
retornar ao Rio de Janeiro para os braços de Vanda, com a certeza ilusória de
que ela mudara, pois o relacionamento deles era áspero e frio. Ao reencontrá-la
no Rio de Janeiro, sente a mesma frieza de outrora, e, apesar de passarem a viver
novamente na mesma casa, estabelecem pouca ou nenhuma comunicação. Diferente da
perspectiva mencionada há pouco, em que a língua é o ponto de partida para o
encontro entre José Costa e Kriska, aqui a língua assume uma nova roupagem, a
comunicação vai ser negada em virtude de um problema afetivo. Por isso, a língua
nesta relação é o elemento que marca a incomunicabilidade entre os dois.
Ao desprezar e
sentir-se desprezado por Vanda, Costa reaviva novamente a sua paixão por Kriska
e deseja fortemente estar mais uma vez com ela em Budapeste, e é isso que ele
faz: volta para lá, porém, surpreende-se com a rejeição de Kriska; isso porque quando
decidiu partir de volta ao Rio, ela sofrera demasiadamente a sua ausência, uma
vez que José retornou ao seu país de origem sem uma explicação legítima.
Eu
tinha alinhavado na cabeça um texto sincero em meus sentimentos por ela, além
de rápida explicação para minha partida. Mencionaria de passagem um filho
enfermo, uma companheira idosa, entre ouros aborrecimentos em meu longínquo
país (BUARQUE, 2003, p.72).
Para (re) conquistar a confiança e o amor
dela, José começa a trabalhar no clube de escritores húngaros. É, então,
incumbido de escrever a biografia de um alemão chamado Krabbe, que pretende
discorrer sobre suas experiências amorosas com estudantes, situações cotidianas
de sua vida e fatos marcantes em um país distante do seu. Esse pode ser considerado
o momento ápice da história, pois o narrador-personagem vê a possibilidade de
escrever sua autobiografia, relatando tudo o que passou em Budapeste, mas sempre
preferindo o anonimato. Tanto que, apesar de estar escrevendo sua própria história,
ele não a publica em seu nome, mas sim, como se fosse a história de Krabbe. Costa
evidencia nessa história como adotou e amou o seu segundo idioma, sua relação
intensa e amorosa com a sua professora Kriska. Com isso, Pode-se observar que
José Costa encontra na escrita do livro em alemão uma tentativa de fuga, a
busca das respostas para sua solidão, ocasionada, entre outros aspectos, pelo
temporário desprezo de Kriska.
RESENHA-02
HOLANDA, Chico Buarque. Leite derramado.
São Paulo: Companhia
das Letras, 2009.
Nascido
na cidade do Rio de Janeiro em 1944, Francisco Buarque de Holanda é considerado
um artista renomado no âmbito nacional, consagrado como compositor, letrista,
romancista e dramaturgo. Em 1962, ganha destaque como cantor e tem seu início
de carreira como escritor, alcançando, posteriormente, destaque na atividade
literária, quando publica o romance Leite Derramado em 2010.
A obra “Leite Derramado” é uma narrativa em
primeira pessoa que mexe
com o imaginário do leitor, envolvendo-o na medida em que ocorre o desenrolar
dos acontecimentos. Este romance retrata a vida de Eulálio Montenegro de Assumpção, um senhor de idade avançada
que se encontra no leito de um hospital, à beira da morte, sofrendo com os
efeitos das drogas utilizadas para diminuir suas dores. No entanto, apesar de seu estado de debilidade, ainda
consegue chamar a atenção das enfermeiras e de todos que passam por ali,
contando sua história que faz alusão aos seus antepassados, ressaltando sempre de
forma esplendorosa sua tradicional família, em vários momentos da história do
Brasil, principalmente o político.
Deforma
totalmente descontrolada, o narrador não utiliza o tempo cronológico na
narrativa, relatando com propriedade o que vivenciou ao longo de sua vida; essa
aparente desordem dos fatos ocorre devido sua memória não se encontrar em
perfeito estado, já que ele a personagem é um senhor de cem anos e possui a
memória quase desfalecida, embora ainda consiga retratar seus tempos de
juventude, mesmo sofrendo terríveis dores.
Isso
faz com que Eulálio às vezes nos deixe com dúvidas quanto ao tempo da
narrativa, pois as lembranças vagas e os pensamentos presentes são embaralhados
em sua cabeça, como ele próprio relata nesta passagem.
Aquela que veio me ver, ninguém
acredita, é minha filha. Ficou torta assim e destrambelhada por causa do filho.
Ou neto, agora não sei direito se o rapaz era meu neto ou tataraneto ou o quê.
Ao passo que o tempo futuro se estreita, as pessoas mais novas têm de se
amontoar de qualquer jeito num canto da minha cabeça...[....] olho para você,
que toda noite está comigo tão amorosa, e fico até sem graça de perguntar seu
nome de novo ( HOLANDA, 2010, p.14.)
Um
aspecto importante é que o personagem demonstra ser bastante rabugento, reclama
com as enfermeiras e ao mencionar histórias sobre o seu passado, faz críticas
ao lugar em que está no momento: possui um neto com boas condições financeiras
e encontra-se jogado em um quarto de hospital com outros enfermos; sua
preferência seria que seu neto arcasse com o tratamento e o internasse em uma
casa de saúde tradicional, de religiosas.
Podemos
perceber claramente que sua família no passado era detentora de grandes
riquezas, entretanto caiu em decadência e este tenta sobreviver de seu
sobrenome, este é um exemplo de pessoas advindas da alta classe social e que
apesar de falidos vivem de aparências e não aceitam perder sua posição social.
Outro aspecto
importante tratado na obra é o preconceito racial: em alguns trechos pode-se
notar que o avô da personagem era racista, sem contar sua mãe que era contra sua
namorada ser de cor mais escura, como mostram as passagens da narrativa em que seu avó deixa implícito que a África seria o
lugar dos negros e sua mãe demonstra preconceito com a raça negra.
Meu
avó foi um figurão do império, grão-maçon e abolicionista radical, queria
mandar todos os pretos brasileiros de volta para a África... (HOLAND,2010, p. 15).
Nem a minha mãe, que ao me ver arrastando a asa para
Matilde, de saída me perguntou se por acaso a menina não tinha cheiro de corpo.
Só porque Matilde era de pele quase castanha, era a mais moreninha das
congregadas marianas... (HOLANDA, 2010, p. 20).
Apesar da narrativa ser de um senhor
centenário que sofre variações a todo instante, os personagens não possuem descrições
detalhadas ou completas, ele conta como conheceu
seu amor Matilde mas não a descreve claramente, demonstrando por ela um ciúme exagerado que gera uma série de
desentendimentos e desconfianças, terminando em desastre.
O curioso nesta Obra é
que o leitor tem que desvendar em alguns momentos com quem o centenário está
conversando, já que seus pensamentos embaralhados pode
acarretar a ideia de que esses acontecimentos não tenham “sentido”, causando certo
estranhamento para alguns leitores. Esse efeito é devido à tamanha
expressividade, combinada com o forte vocabulário de palavras que por vezes é utilizado
para o personagem relembrar de suas primeiras experiências e desejos afetivos, ou
para fazer relação a sua sexualidade, aspecto esse que vai se intensificando ao
longo da trama.
O título da obra “Leite
Derramado” remete ao fim do personagem Eulálio de Assumpção que morre no
hospital aos 100 anos por causa de uma doença que não é relatada no livro.
É uma obra surpreendente
e diferente, a qual prende a atenção do leitor e o leva a refletir acerca de
suas próprias atitudes, um livro instigante onde o autor, como num jogo de
quebra-cabeças espalha as peças para que o leitor as encaixem e tire suas
próprias conclusões.
Alessandra Marinho
Samara Nascimento
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